533 Palavras

Faria de novo o mesmo trajeto. Não podia ser. Além daquele beco molhado e
sujo, não havia nenhuma outra saída ou rua que pudesse ter tirado aquele
homem dali. Se não ele não se desintegrara no ar devia estar ali, talvez
dentro da caçamba de lixo ou atrás daquele sofá velho e rasgado que servia
de casa para vários gatos e ratos.
Não, desta vez ele não lhe escaparia. Ela queria ao menos agradecer e saber
se ele estava ferido. Fora uma briga feia aquela dentro do Foxxxy club. E
por mais que ela tentasse se convencer de que não era culpa dela, sabia que
tinha lá sua parcela nessa confusão toda, e sabia também que Dan, o gerente,
com certeza lhe descontaria o salário para pagar o prejuízo.
Roy sempre fora violento. Não passava de um bêbado psicótico que a
atormentava a vida mesmo agora que já não estavam mais juntos. Aparecia na
boate quase que todos os dias para vigiar Loo. No ultimo mês a situação só
piorou. Primeiro porque já tinha começado a temporada de chuvas, segundo
porque surgira na boate um estranho que comparecia todos os dias para ouvir
Loo cantar melodias de cabaré enquanto garotas loiras despiam-se e giravam
em postes. O sujeito aparecera justamente no segundo show que Loo fez no
Foxxxy. Ela dizia que fora promovida, uma vez que não mais precisava tirar a
roupa, mas no fundo sabia que não era lá uma grande inovação, pois ainda
trajava trajes mínimos e ainda tinha notas jogadas quase que em sua cara por
clientes bêbados. Loo sentia que estava fadada a mediocridade.
O tal de quem ninguém sabia o nome, e cujo rosto estava sempre na penumbra
parecia que anda constantemente em uma esteira. Movia-se fluidamente,
principalmente nesta estação do ano, quando a cidade de Intempera ficava
imersa na neblina baixa, ainda mais na área do cais. Dan dizia que aquele
cliente desconhecido parecia ter chegado com a primeira gota de chuva, que,
aliás, estava um mês adiantado, porque geralmente a temporada das águas só
começava em Dezembro.
Ninguém nunca havia ouvido o som de sua voz até esta noite, quando Roy
perdeu a paciência com Loo e arrancou-a de cima do palco. O cliente
silencioso saiu de sua mesa no fundo do lugar e lançando mão de uma
velocidade surpreendente atacou Roy pelas costas. Os dois caíram no chão em
uma luta patética, uma vez que Roy mais quebrava cadeiras do que
propriamente acertava o adversário. Quando os seguranças finalmente puseram
fim à briga, o estranho desapareceu como que num apagar de luzes.
Loo, que estava embaixo da marquise tentando fumar seu último Capri da
noite, na tentativa estúpida de se acalmar, viu um vulto passar, e dele
consegui distinguir somente os cabelos. Era ele. Ela precisava agradecer,
mas ao chegar ao beco ele sumira. A chuva ficou mais forte e uma rajada de
vento soprou subitamente os seus cabelos. Isso lhe trouxe uma sensação de
lembrança, mas não sabia do quê. Então ouviu uma voz atrás de si: - Já faz
tempo e essa carcaça de carne podre pode ter lhe tirado a memória, mas o que
me diz de uma ultima cavalgada, hein Valkíria?

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