547 Palavras

–Aisolni, você sabe por que nós, os Tulips, somos diferentes de vocês, Nânimons?
–Você não consegue ver as diferenças, Spot?
–Não. Somos quase da mesma altura, temos olhos, boca, braços, cabelos... Alguns de nós são mais altos e mais fortes que muitos Nânimons, mas ainda assim, vocês é que nos controlam.
–É só isso que você vê? Não vê diferença nenhuma?
–Não. Exceto, claro, pelas roupas. As de vocês são novas, macias... e nós temos de usar essas roupas velhas de panos ásperos... Além disso, dormimos nas cavernas, enquanto vocês vivem nos palacetes que nós construímos.
–Isso é inveja, Spot?
–Pelos bigodes de Suth, Aisolni, não! Só quero entender as diferenças. Nós também temos inteligência, podemos ler, escrever, aprender como vocês, mas a escola nos é proibida. Se um de nós vestisse roupas bonitas, freqüentasse a escola e vivesse num palacete, quem seria capaz de dizer que era um Tulip?
–Não são só a roupa e a instrução que diferenciam Tulips e Nânimons, Spot. Se você quiser eu te dou roupas finas e te deixo ir comigo à escola. Talvez, então, você entenda.

Spot recebeu roupas novas de Aisolni e foi com ela à escola. Logo nas primeiras aulas percebeu que não era capaz de acompanhar as matérias. Apesar das roupas, todos o ignoravam como a um animal de estimação que acompanhasse a dona só para fazer companhia. Um macaco ou uma tartaruga. Alguns olhavam para ele e diziam: "Que bonitinho". E acrescentavam: "Olha, você o vestiu como Nânimon, Aisolni". Depois de alguns dias, porém, ninguém mais se dirigia a Spot como um Tulip. Ele começou a se sentir um verdadeiro Nânimon. E sua ama o deixava acreditar que eram iguais.

–Aisolni...
–Que é Spot?
–Eu já me visto como você, vou à escola como você... ninguém mais me acha diferente de você.
–Você acha isso, Spot?
–Acho. Eu sou igual a você, como havia lhe dito. Sou um Nânimon.
–Então, se você acha isso, aço que você se tornou um Nânimon, Spot.
–Somos irmãos, então?
–Sim, somos irmãos. Como você quiser.
–Posso dormir aqui dentro hoje?
–Pode, você é um Nânimon, deve dormir no palacete.

Naquela noite Spot não dormiu, apenas fingiu. Quando todos estavam dormindo se levantou e furtou dos armários todas as roupas que pôde carregar. Pegou perfumes, cremes, sandálias, pinturas e as levou às cavernas como tinha combinado. Os Tulips se banharam no rio Galvin e se vestiram e pintaram como Nânimons. Ninguém poderia perceber diferença.
Invadiriam os palacetes e tomariam o poder. Eram iguais. Esse separatismo era pura política. Os Nânimons criavam as leis a seu favor e os Tulips eram sempre discriminados, servos da poderosa minoria, como se fossem outra raça, outra espécie.

Spot chegou sorrateiro perto da cama de Aisolni, brandiu com força o machado e golpeou-a na barriga enquanto dormia. Era como se tivesse golpeado uma pedra. A moça abriu os olhos e se levantou serena. Meneou a cabeça e lamentou:
–Oh, Spot, eu achei que você era feliz. Dei a você tudo que quis. Cheguei mesmo a achar você ligeiramente parecido com um Nânimon.
E tocou-lhe a testa com o dedo fazendo-o evaporar numa inócua nuvem de pó branco que rapidamente se dissipou na atmosfera. Deitou-se e voltou a dormir sem derramar lágrima pelo seu animalzinho rebelde.

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